Conceito
A giardíase é definida como uma infecção intestinal provocada pela Giardia, um protozoário flagelado que habita o intestino delgado de mamíferos, aves, répteis e anfíbios. Giardíase é, no mundo, a maior causa de diarréia transportada a partir de água e alimentos contaminados.
Em 1681, Anton van Leewuenhoek observou trofozoítos em suas próprias fezes, descrevendo-os como “animalúnculos móveis”. Mais tarde, em 18
59, Lambl descreveu-os mais detalhadamente e os denominou Cercomonas intestinalis, acreditando serem esses pertencentes ao gênero Cercomonas. Somente em 1882 o gênero Giardia foi criado, quando Kunstler observou protozoários flagelados no intestino de girinos de anfíbios anuros. Os protozoários do gênero Giardia pertencem à família Hexamitidae, à ordem Diplomonadida, à classe Zoomastigophora, ao subfilo Mastigophora e ao filo Sarcomastigophora.
A partir da definição do gênero, várias espécies foram nomeadas, tendo sua classificação baseada nas próprias características morfológicas do parasita ou no seu hospedeiro de origem. A classificação mais aceita, desde então, foi proposta em 1952 por Filice, a qual divide o gênero Giardia em três espécies: Giardia duodenalis, também denominada Giardia lamblia ou Giardia intestinalis, encontrada nos mamíferos, incluindo o homem, aves e répteis. Giardia muris, encontrada em aves, répteis e roedores; eGiardia agilis, a qual parasita anfíbios. Outras espécies foram também identificadas, como a Giardia psittaci e Giardia ardeae, encontradas em aves; e Giardia microti, encontrada em roedores.
A classificação taxonômica da Giardia ainda se mantém controversa. Alguns autores acreditam que o hospedeiro de origem não constitui um critério adequado de classificação, visto que a análise de DNA mostrou que Giardias de um mesmo hospedeiro podem ser bastante distintas, enquanto que espécies encontradas em diferentes hospedeiros podem apresentar-se idênticas. Alguns estudos moleculares indicaram que a Giardia lamblia é um complexo de componentes morfologicamente idênticos, porém distintos geneticamente. Esse fator dificulta o estabelecimento do potencial zoonótico da giardíase, embora a Organização Mundial de Saúde, OMS, já considere essa doença uma zoonose, baseada em evidências de contaminação de reservatórios de água por animais parasitados.
A giardíase ocorre em todas as regiões do mundo, principalmente em climas temperados e tropicais. É comum em ambos os sexos, acometendo com maior intensidade crianças com menos de dez anos. Assim como outras parasitoses, a giardíase é mais prevalente em países em desenvolvimento, onde geralmente o tratamento de água é inadequado e as condições sanitárias precárias. É ainda o parasita intestinal mais encontrado na população de países desenvolvidos. Trata-se de uma das causas mais comuns de diarréia entre crianças, podendo levar a complicações como má-nutrição e retardo do desenvolvimento.
Morfologia
A Giardia lamblia apresenta duas formas evolutivas durante o seu ciclo biológico: O trofozoíto e o cisto. O primeiro é responsável pelos sinais e sintomas característicos da giardíase e o segundo é a forma infectante. Notam-se características biológicas marcantes no parasita em questão, como a ausência de organelas comuns em células eucarióticas (mitocôndrias, complexo de Golgi, peroxissomos), o que torna mais difícil entender a patogenia da giardíase.
O trofozoíto tem 10 a 20 micrômetros de comprimento por cinco a 15 micrômetros de largura, apresenta simetria bilateral e um achatamento dorso-ventral que lhe confere um aspecto piriforme. A face dorsal é lisa e convexa, enquanto a face ventral é côncava. Na face ventral aparece uma estrutura denominada disco adesivo, disco ventral ou disco suctorial, semelhante a uma ventosa. Essa estrutura é formada por microtúbulos e microfilamentos, que proporcionam a fixação do parasita às células epiteliais da mucosa intestinal. A adesão do parasita à mucosa intestinal é tema de várias pesquisas que tentam identificar os eventos moleculares que regulam as junções epiteliais em vários tipos de doenças gastrointestinais. Ainda na face ventral, aparecem os corpos medianos, estruturas paralelas em forma de vírgula, utilizadas também para a diferenciação das várias espécies. Os axonemas são formações lineares negras que percorrem o corpo celular longitudinalmente, conferindo-lhe a simetria bilateral. Internamente, os trofozoítos apresentam dois núcleos ovóides idênticos, cada um com um cariossomo e sem cromatina periférica, localizados no disco adesivo da região anterior; e um citoplasma com retículo endoplasmático, ribossomos e aparelho de Golgi. Os trofozoítos apresentam quatro pares de flagelos: um par anterior, um ventral, um posterior e um par caudal. A atividade desses flagelos permite o deslocamento rápido e irregular de parasita. Os trofozoítos são encontrados principalmente na porção superior do intestino delgado, mas podem ocupar excepcionalmente outras porções do intestino delgado, bem como o intestino grosso; nutrem-se por pinocitose na membrana e sua reprodução ocorre por divisão binária longitudinal.
Já o cisto mede de 8 a 14 micrômetros de comprimento por sete a 10 micrômetros de largura e apresenta-se como uma estrutura oval ou elipsóide. No seu interior aparecem dois ou quatro núcleos pequenos e circulares, uma quantidade variável de axonemas e os corpos escuros ou corpos em crescentes, localizados no pólo oposto ao núcleo. Os cistos apresentam uma membrana externa, de 0,3 micrômetros de espessura, a qual é bem destacada do citoplasma e tem natureza glicoprotéica. Essa parede cística faz com que os cistos se tornem resistentes às variações de temperatura e umidade e à ação de alguns produtos químicos.
A Giardia é considerada um parasita estritamente assexuado. Estudos recentes, entretanto, têm questionado esse fato, devido às evidências experimentais que sugerem sexo e recombinação genética nesse parasita. As pesquisas mostraram a presença, no genoma da Giardia, de cinco pares de genes homólogos (Dmc1, Spo11, Mnd1, Hop1, Hop2) que têm função conhecida durante a meiose em outros eucariotos. Supõe-se que a expressão desses genes possa facilitar a troca de material genético entre e dentro dos dois núcleos durante os processos de encistamento e desencistamento. Acredita-se que a recombinação genética seja um evento relativamente raro, mas que traria vantagens evolutivas para a Giardia, como o aumento da capacidade de responder a condições diversas, inclusive a exposição freqüente a drogas antigiardicidas.
Ciclo Biológico
A Giardia lamblia é um parasita monoxênico, de ciclo biológico direto. A facilidade de manter esse ciclo in vitro contribui para o desenvolvimento de várias pesquisas. As formas infectantes para homens e animais são os cistos, sendo estes, portanto, os responsáveis pela disseminação da doença. A transmissão ocorre por via fecal-oral: de forma indireta, por meio da ingestão de água e alimentos contaminados, ou de forma direta, de pessoa a pessoa por meio de mãos contaminadas ou entre homossexuais masculinos. A transmissão direta também pode ocorrer a partir do contato direto com animais infectados.
A ingestão de 10 a 25 cistos é suficiente para iniciar a infecção num hospedeiro humano. Ao ser ingerido, o cisto alcança o estômago, onde o meio ácido inicia o processo de desencistamento. Esse processo completa-se no intestino delgado, principalmente duodeno e jejuno, onde ocorre o rompimento dos cistos e a liberação dos trofozoítos. Cada cisto maduro com quatro núcleos libera dois trofozoítos binucleados. Por reprodução assexuada, num processo de divisão binária longitudinal, os trofozoítos multiplicam-se e colonizam o intestino. Eles se mantêm aderidos à mucosa intestinal por meio do disco suctorial. O ciclo se completa pelo encistamento, processo no qual o trofozoíto se retrai, condensa e secreta uma membrana resistente, composta inclusive de quitina. Já no interior dos cistos formados ocorre nucleotomia, o que origina cistos maduros tetranucleados que serão eliminados para o meio exterior. O processo de encistamento ocorre na porção final do íleo e principalmente no ceco do hospedeiro, mas ainda não está totalmente esclarecido. Supõe-se a influência de fatores dentro ou fora do parasita, dentre os quais se destacam o PH intestinal, e estímulo de sais biliares e o destacamento do trofozoíto da mucosa, sendo este último o fator de maior destaque, supostamente provocado pela resposta imune local. Os cistos são excretados junto com as fezes do hospedeiro, mas não são eliminados de forma contínua. Eles são definidoscomo a forma infectante, mas não se sabe ainda se necessitam de um período de maturação, ou se já são infectantes logo após serem excretados. Se mantidos em condições favoráveis de temperatura e umidade, os cistos podem se manter viáveis por até dois meses no meio ambiente. O elevado número de cistos eliminados pelas pessoas parasitadas, a alta resistência do cisto aos fatores ambientais e também a transmissão direta por contato com animais contaminados torna ainda mais preocupante a disseminação desta doença.
Patogenia
A giardíase pode originar quadros clínicos como diarréia e má-absorção intestinal. Os mecanismos pelos quais a Giardia provoca esses sintomas ainda não estão bem esclarecidos. Conhecem-se dois processos utilizados para a sobrevivência do parasita: variação antigênica e encistamento. A variação antigênica confere ao parasita uma alternância de antígenos de superfície específicos entre 6-13 gerações. Já o encistamento, é o processo no qual é formada a parede cística que promove a resistência do parasita às alterações ambientais.
Sabe-se que ao colonizar o intestino, o parasita adere à mucosa intestinal, por meio do disco suctorial ou ventral e produz irritação, alterando a estrutura dessa mucosa e lesionando principalmente as microvilosidades, que podem se tornar achatadas ou atrofiadas. A lesão nas microvilosidades está associada à redução de lactase, sucrase e maltase nas membranas. Dessa forma, a área de absorção da mucosa intestinal torna-se reduzida, podendo resultar num quadro de má-absorção. Esta lesão na borda em escova do epitélio intestinal pode explicar, ainda, a intolerância a lactose que frequentemente se desenvolve. É válido ressaltar o fato de que a microscopia óptica pode mostrar uma mucosa normal e essa mesma estrutura, quando analisada na microscopia eletrônica, revelar a presença de lesões nas microvilosidades. Tais lesões podem estar diretamente relacionadas à diarréia na infecção por giardíase. Nessa infecção, o parasita pode alterar o epitélio intestinal sem que haja invasão tissular, ou seja, a Giardia causa lesões sem penetrar no epitélio, invadir tecidos vizinhos, ou cair na corrente sanguínea.
Estudos in vitro indicam que a Giardia rompe as junções de oclusão do epitélio intestinal, isso aumenta a permeabilidade e a absorção macromolecular no intestino delgado, sobretudo no jejuno, principalmente durante o período de pico de colonização dos trofozoítos.
Os processos patofisiológicos relacionados à giardíase são multifatoriais: podem estar relacionados às características do parasita, como linhagem e o número de cistos ingeridos; ou podem relacionar-se às características do hospedeiro, como resposta imune, estado nutricional, o PH do suco gástrico e microbiota intestinal.
A existência de linhagens diferentes de Giardia duodenalis permite a compreensão de que alguns grupos geneticamente diferentes possam ser mais ou menos patogênicos, isto é, algumas cepas do protozoário teriam uma capacidade maior em produzir mudanças morfológicas no intestino e assim interferir no transporte de fluidos e eletrólitos. Estudos recentes identificaram glicoproteínas de superfície que induzem o acúmulo de líquido no intestino do hospedeiro. Da mesma forma, algumas substâncias liberadas pelos trofozoítos, como proteínas e lecitinas, podem ser consideradas tóxicas, alterar a permeabilidade das células e ser responsáveis diretamente pela lesão do epitélio intestinal. Na giardíase crônica ocorre perda de função da barreira epitelial; este fator está diretamente associado ao aumento da ativação dos genes que levam às cascatas de apoptoses dos enterócitos, ou seja, a disfunção da barreira epitelial em pacientes com giardíase crônica está também associada ao aumento das taxas de apoptose dos enterócitos. Esse fenômeno ocorre, em parte, porque os trofozoítos deGiardia consomem a arginina local e inibem os enterócitos de produzirem óxido nítrico,(NO), uma substância imunomoduladora cuja ação antiinflamatória inibe a produção de citocinas inflamatórias ou impede a produção dos mediadores inflamatórios locais, que retardariam o desenvolvimento dos trofozoítos.
Em relação ao hospedeiro, a resposta imune é um dos fatores de maior destaque. Envolve mecanismos celular e humoral, sendo este último comum em todos os pacientes infectados, o responsável pelo decréscimo no número de células IgA e aumento de células IgM. Durante o processo inflamatório, há um aumento de linfócitos intra- epiteliais, de forma que o grau de infiltração linfocitária está diretamente relacionado à intensidade da má-absorção intestinal. Isto significa que quando a barreira epitelial é lesionada, os antígenos presentes no lúmen intestinal ativam uma resposta imunológica, a partir da interação parasita-hospedeiro. A variação antigênica, entretanto, confunde o sistema imune do hospedeiro e assim, engana a sua resposta imunológica, o que lhe rende maior prazo de parasitismo. Alguns estudos demonstraram que a ativação de linfócitos T com marcadores CD8+ pode induzir a retração das vilosidades, o que seria também responsável pela deficiência de dissacaridases e má absorção durante a diarréia crônica. Já os linfócitos T com marcadores CD4+ estão ativos durante o processo de eliminação do parasita. Sabe-se que a motilidade intestinal é outro mecanismo de defesa do hospedeiro: o aumento espontâneo de colecistoquinina (CCK), induzido pelas contrações longitudinais da musculatura lisa, mediada principalmente pela degranulação dos mastócitos e a falta de relaxamento muscular do tubo digestivo, aumentam o trânsito intestinal e a eliminação dos trofozoítos de Giardia. Esse conhecimento é útil também no desenvolvimento da ação farmacológica de algumas drogas.
Quando presentes em grandes quantidades, os trofozoítos de Giardia formam uma espécie de tapete em todo o duodeno, reduzindo a ação das dissacaridases e prejudicando a absorção de vitaminas lipossolúveis, vitamina B12, ácidos graxos, ácido fólico, glicose, sódio e água. Com essa deficiência na absorção, acumula-se na luz do intestino um elevado teor de gorduras e outros elementos, o que pode gerar um quadro de esteatorréia. Em infecções crônicas pode ocorrer hipersecreção de cloreto na luz intestinal. Esse fator, associado à má-absorção parece ser o responsável pelo acúmulo de líquido no intestino, resultando em diarréia grave e crônica.
De maneira geral, os vários achados indicam que, na giardíase, as mudanças na estrutura e função dos enterócitos estão associadas à perda de função da barreira epitelial levando, conseqüentemente ao quadro característico da diarréia. Acredita-se que uma melhor compreensão dos processos fisiopatológicos da giardíase ajudaria a descobrir novos tratamentos para outras doenças que tem em comum o fato de as anormalidades epiteliais serem responsáveis pela má-absorção intestinal e pela diarréia, como na doença de Crohn e doença celíaca.
Estudos revelam que a infecção por Giardia torna-se mais severa em pacientes com acidez gástrica reduzida ou em indivíduos imunodeprimidos. O quadro sintomático é mais comum entre os menores de cinco anos, diminuindo muito após a adolescência.
A giardíase apresenta um amplo espectro clínico: desde assintomática até sintomática com um quadro de diarréia aguda ou um quadro de diarréia persistente. A infecção pode ocorrer com a ingestão tão pouco quanto 10 a 25 cistos. Dentre as pessoas que ingerem os cistos da Giardia, 5% a 15% apresentam a forma assintomática, 25% a 50% desenvolvem diarréia aguda auto-limitante, e 35% a 70% não apresentam evidencias de infecção.
A forma sintomática aguda da infecção por giárdia dura poucos dias e apresenta diarréia (89%) aquosa e explosiva de odor fétido, indisposição (84%), gases (74%), distensão, dores abdominais (70%), náusea (68%), anorexia (64%) e perda de peso (64%). A presença de muco e sangue nas fezes raramente ocorre.
Já a forma sintomática crônica da giardíase pode persistir por vários anos com a presença de episódios diarréicos contínuos, intermitentes ou esporádicos. Além disso, pode apresentar esteatorréia (aumento de gordura nas fezes), perda de peso mais significativa e má absorção intestinal. As principais complicações da giardíase crônica estão relacionadas à má absorção de gorduras e nutrientes como, por exemplo, algumas vitaminas e o ferro. As crianças sofrem o maior impacto dessa deficiência nutricional, uma vez que pode afetar o seu desenvolvimento físico e mental.
Diagnóstico
1-DIAGNÓSTICO CLÍNICO:
As manifestações clínicas são variadas e ocorrem de uma a três semanas após a infecção. Pode ocorrer diarreia, fezes mal cheirosa, flatos, cólicas, náuseas perda de peso. A forma disentérica, com muco e sangue nas fezes, é infrequente. Podem ocorrer formas assintomáticas além de síndrome de má absorção que poder levar ao retardo do desenvolvimento. A giardíase deve sempre entrar no diagnóstico diferencia das diarreias e pode ser diferenciada das bacterianas e virais pela maior duração e pela presença de perda de peso.
2- DIAGNÓSTICO LABORATORIAL:
O diagnóstico laboratorial, inclui principalmente o exame de fezes, e enteroteste, e os métodos imunológicos.
O exame parasitológico de fezes é a principal alternativa para o diagnóstico da giardíase, por ser de fácil execução, baixo custo e um procedimento não-invasivo. Durante esse exame, nas fezes liquefeitas, devem-se pesquisar as formas de trofozoítos, enquanto que nas fezes formadas ou pastosas, pesquisa-se a presença de cistos. Sabe-se que os indivíduos infectados não liberam cistos continuamente e que o padrão de excreção varia de um indivíduo a outro. Esse fato dificulta o diagnóstico, pois o “período negativo”, no qual os indivíduos parasitados não liberam cistos, pode levar a resultados falso-negativos. A fim de evitar esse problema, recomenda-se o exame de três amostras fecais em dias alternados ou com intervalos de sete dias entre cada uma, o que aumenta a positividade do exame,
O enteroteste, ou teste do barbante, é pouco utilizado no Brasil e também não apresenta positividade alta. Um método seguro é a pesquisa de antígenos nas fezes utilizando principalmente a técnica Imunoenzimática (ELISA), ou a Imunocromatografia qualitativa de fase sólida. Ambos apresentam elevada sensibilidade e especificidade, embora ainda tenham um custo operacional alto
Tratamento
Os principais medicamentos utilizados no tratamento da infecção por Giardia são os derivados dos nitroimidazóis, dos nitrofuranos e dos corantes de acridina. Os nitroimidazóis são os mais empregados, uma vez que apresentam baixo custo e elevadas taxas de cura. Dentre os nitroimidazóis destacam-se o metronidazol, o tinidazol, o ornidazol e o secnidazol.
O metronidazol é a droga mais utilizada no tratamento da giardíase. Recomenda-se 15 a 20mg/kg durante sete a dez dias consecutivos, para crianças, via oral; a dose para adultos é 250mg, duas vezes ao dia. A desvantagem do metronidazol é a presença de muitos efeitos colaterais como náuseas, vômitos, vertigens, dores de cabeça e, em alguns casos, toxicidade em relação ao sistema nervoso central. Alguns estudos têm mostrado, ainda, possíveis efeitos carcinogênicos e mutagênicos relacionados com esquemas terapêuticos prolongados com metronidazol. Além disso, a eficácia do metronidazol se apresenta reduzida em alguns casos, provavelmente devido à resistência de cepas de Giardia ao tratamento com este medicamento.
Assim, outras drogas têm sido avaliadas como opções para o tratamento da giardíase. Estudos demonstraram que o albenazol, um derivado dos benzimidazóis, apresenta atividade giardicida e possui a vantagem de ser pouco absorvido pelo organismo do hospedeiro, reduzindo os efeitos colaterais. A dosagem recomendada é de 400mg por dia durante cinco dias. Outro medicamento disponível apresenta eficácia superior ao metronidazol no tratamento da giardíase: a nitazoxanida, um derivado dos 5-nitrotiazóis, cuja dose recomendada é de 500mg, duas vezes ao dia para adultos e crianças a partir de 12 anos de idade; 200mg, duas vezes ao dia, durante três dias emcrianças de 4 a 12 anos.
A completa caracterização do genoma da Giardia duodenalis deve facilitar a identificação de novos alvos farmacológicos para a giardíase. Há que se destacar a importância do estudo e desenvolvimento de novos medicamentos antigiardicidas para servirem de opção no caso de pacientes que apresentam resistência aos esquemas terapêuticos convencionais.
Profilaxia
A giardíase tem maior incidência entre os grupos populacionais que apresentam condições de higiene mais precárias e em instituições fechadas, como asilos, creches e orfanatos. A contaminação pode ocorrer a partir da ingestão de água poluída com dejetos humanos, ou de alimentos contaminados com matéria fecal, bem como com a ingestão direta de cistos oriundos de mãos contaminadas de indivíduos infectados, ou nas relações entre homossexuais.
A fim de evitar a disseminação dessa parasitose, recomendam-se medidas profiláticas, como: o acesso universal à educação, instruções de educação sanitária e higiene pessoal, saneamento básico adequado, tratamento da água para consumo, combate aos artrópodes no ambiente doméstico e destino adequado para as fezes. Medidas simples, como a lavagem das mãos antes das refeições e após as evacuações, bem como a lavagem dos alimentos ingeridos crus, são de grande importância na prevenção da giardíase.
Grande parte dos casos de infecção provém do consumo de água contaminada. Sabe-se que a desinfecção química, como a cloração normalmente utilizada no tratamento da água, não é suficiente para inativar os cistos de Giardia; uma melhoria no sistema de tratamento da água seria, então, fundamental na prevenção dessa parasitose. Recomenda-se a fervura da água para consumo, pois apesar de resistirem à cloração, os cistos são destruídos em água fervente.
É recomendado o tratamento de todo caso de infecção por Giardia duodenalis, já que a grande maioria dos casos é de portadores assintomáticos, os quais podem agir como eliminadores de cistos, facilitando a disseminação. De forma semelhante, recomenda-se a detecção do parasitismo por Giardia em animais domésticos, como cães e gatos, e o seu tratamento, atitude esta baseada nas evidências da transmissão zoonótica da giardíase.
Referências Bibliográficas
1. HUANG, David; WHITE, Clinton. An updated rewiew on Cryptosporidum and Giardia. Gastroenterology clinicsa of North America, v. 35, p.291-314, 2006.
2. ORTEGA-PIERRES, Guadalupe et al. New tools provide further insights into Giardia and Cryptosporidium biology. Trends in Parasitology, v.25, n.9, p.410-416.
3. BURET, Andre G. Mechanisms of epithelial dysfunction in giardiasis. GUT, v. 56, p. 316-317, 2007.
4. BUSATTI, Haendel; SANTOS, Joseph; GOMES, Maria. The old and new therapeutic approaches to the treatment of giardiasis: Where are we? Biologicas:targets e therapy, v.3, p 273-287, 2009.
5. CARRANZA, Pedro; LUJAN, Hugo D. New insights regarding the biology of Giardia lamblia. Microbes and Infection, v. 12, p. 71-80, set. 2007.
6.AMATO NETO, V. et al. Parasitologia: uma abordagem clínica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008
7. CIMERMAN, S.; CIEMRMAN, B. Medicina Tropical. Editora Atheneu – 2003
8. MARKELL, E. K. et al. Parasitologia médica. [S. l.]: Guanabara Koogan, 2003.
9. NEVES, D. P. et al. Parasitologia humana. [S. l.]: Atheneu, 2005.
10. REY, L. Parasitologia. [S. l.]: Guanabara Koogan, 2008.
11. REY, L. Bases da Parasitologia Médica. . [S. l.]: Guanabara Koogan, 2002.